domingo, setembro 18, 2016

A verdade sobre São Cosme e São Damião

São Cosme e São Damião, Mártires 
 
Sofreram o martírio durante a perseguição de Diocleciano (284-305). Eram irmãos gêmeos e médicos, exercendo sua profissão gratuitamente, por caridade cristã, e nela obtendo curas espantosas... Durante a perseguição de Diocleciano (284-305) foram açoitados e em seguida decapitados, porque se recusaram a cultuar aos ídolos. Foram martirizados e tiveram seus nomes incluídos no Cânon da Missa e são invocados como protetores contra as doenças do corpo e da alma.

O QUE A TRADIÇÃO DIZ SOBRE ELES?

Segundo a tradição, São Cosme e São Damião eram dois irmãos que curavam “todas as enfermidades, não só das pessoas, mas também dos animais, fazendo tudo gratuitamente”. Por serem médicos, foram escolhidos como patronos dos médicos e dos farmacêuticos. Segundo uma certa tradição, São Damião, contrariando a regra de caridade, aceitou a remuneração de Paládia, uma mulher por ele curada, e isto provocou uma severa bronca da parte de seu irmão, que protestou não querer ser sepultado ao lado dele após a morte. A igreja no dia 26 de setembro celebra a honra do martírio deles.

E PORQUE ALGUNS COMEMORAM NÃO NO DIA 26 MAIS SIM NO DIA 27?

Infelizmente, o culto desses santos benfeitores foi misturado ao sincretismo religioso dos cultos afros e outros, causando confusão no povo católico.

Algumas entidades religiosas não católicas costumam distribuir doces para as crianças baseado em uma lenda que diz que um dia Cosme e Damião, fizerem uma cura milagrosa em um homem muito rico, e este homem ficou muito agradecido e então resolveu dar uma grande quantia em dinheiro para eles, porém como já vimos anteriormente, eles exerciam sua profissão gratuitamente e não aceitavam dinheiro, e por meo disso, resolveram não aceitar o dinheiro do homem, mas o homem ficou muito raivoso com a ação deles, então Cosme e Damião ao ver isso, decidiram receber o dinheiro. Eles por não saber o que fazer com tanto dinheiro, olharam uma imensa multidão de crianças em lugar e decidiram gastar todo o dinheiro para comprar bombons e distribuir aos meninos(a)... Dai se vem a tradição da distribuição de bombons no dia 27 que foi inventada pelo culto pagão dos cultos afros. 

Evidentemente, os católicos não devem participar disso, pois é um desvirtuamento do culto desses santos. Esta prática só será válida para os cristãos, se for feita por pura caridade, sem qualquer outra conotação. Eles devem ser cultuados na fé da Igreja e nas Missas.

MAS PORQUE OS CULTOS AFROS E OUTROS PEGARAM ESTES SANTOS PARA CULTUAR EM SEUS RITUAIS PAGÃS? 

Isso aconteceu por causa do SINCRETISMO RELIGIOSO, os escravos, para não serem punidos por estarem adorando os deuses africanos, deram a estes deuses nomes de santos da Igreja Católica, assim podiam enganar aos seus senhores.

Os "santos" dos umbandistas são ídolos "deuses" africanos com nome dos santos. Aos santos Cosme e Damião, eles disfarçam o nome de IBEJÍ, que são demônios cultuado na umbanda como os orixás que protegem as crianças. 

Todo católico que se torna adepto desses cultos, esta deixando de lado o cristianismo para se tornar um pagão, pois a umbanda e o catolicismo não se misturam. 

Os Santos da IGREJA são servos de Deus; pois A SANTIFICAÇÃO é obra de Deus (Ex 31,13) Sl 149,5: “Exultem OS SANTOS NA GLÓRIA[...]” 9: “Para fazerem neles O JUÍZO escrito; ESTA SERÁ A HONRA DE TODOS OS SEUS SANTOS." - Jamais nos entreguemos aos ídolos, pois Deus abomina isso, o que fazemos na igreja é venerar estes santos que deram um grande exemplo de seguimento a Cristo nesta terra. Como diz São Paulo: Deus não é injusto e não esquecerá vossas obras e a caridade que mostrastes por amor de seu nome, vós que servistes e continuais A SERVIR OS SANTOS. Desejamos, apenas, que ponhais todo o empenho em guardar intata a vossa esperança até o fim, e que, longe de vos tornardes negligentes, sejais IMITADORES daqueles que pela fé e paciência SE TORNARAM herdeiros das promessas. cf ( Hb 6, 10 12) 

POSSO COMER BOMBONS OU ALIMENTOS CULTUADOS PELA UMBANDA? 

Sim, podemos. Pois o alimento não é impuro, mesmo que sejam os alimentos que são usados aos cultos dos deuses. 

Impuro é o que sai de dentro da gente, do nosso coração, da nossa boca.

Espero que tenham compreendido um pouco da historia destes belos santos, e lembre-se, na igreja católica é dia 26 e não 27. 

Paz e bem!

São Cosme e Damião, rogai por nós! 

Por Gilson Azevedo - 26/09/2014 




Querem saber de mais historias como essa e assuntos da igreja? Curtam Católicos Defensores da Fé​

A Bruxaria e a Feitiçaria no contexto da Inquisição


A magia foi outra das causas da Inquisição; era o culto da superstição, sortilégio, alquimia, culto e pactos com o demônio, que se faziam no “Sabath”. A crença na magia e nas “bruxas”, sempre existiu nos tempos antigos e medievais. A justiça leiga combatia a magia e perseguia os magos e as bruxas severamente e os levava ao fogo. A legislação os reprimia; muitas vezes, eram punidos de leve pelo tribunal eclesiástico, mas depois eram de novo castigados com a morte pela justiça leiga.

Na magia o sujeito pretende ter domínio sobre as forças da natureza e assim produzir fenômenos contra ela, com auxílio de forças ocultas vindas do além, onde entra muita superstição (rezas, adivinhações, amuletos, elixires, etc.). A bruxaria apela para a intervenção do demônio; acreditavam que as bruxas voavam em vassouras ou sobre animais, que na verdade são demônios.

Segundo os historiadores, tudo isso gerava sérios problemas sociais, morais e religiosos; os magos e bruxos com os seus “poderes” amedrontavam a população e tiravam proveito disso. Tomavam dinheiro de seus clientes mediante “trabalhos” que envolviam assassinatos, envenenamentos, infanticídios, fraudes, violências e orgias sexuais. Eram recomendados feitiços de muitos tipos: para prejudicar pessoas, matar animais, conseguir amor ou desamor, morte, cegueira, doença, envenenar cursos de água, matar plantações e gado, provocar tempestades, raios, incêndios, etc.

No Sabath se realizava a “missa negra” nos dias santos, com a imagem de satã sobre o altar, nessa famosa assembleia do sábado à meia noite onde as bruxas e bruxos se reuniam sob a presidência do diabo em forma de bode. O Prof. Gonzaga assim narra:

“Começava a festança quando todos deviam beijar o traseiro desse animal. Seguiam-se comidas e bebidas fartas, em meio a imensas orgias e depravações sexuais, inclusive com os demônios presentes, e era voz corrente que também se procedia ao sacrifício ritual de crianças” (p. 163).

O historiador Gustav Heningsen, no Simpósio do Vaticano (1998) diz que é preciso cuidado ao recorrer ao diagnóstico psiquiátrico para explicar a bruxaria, porque a maioria dos que se dedicavam a isso, eram pessoas perfeitamente normais, apenas influenciadas pelo ambiente em que viviam.

Assim, a bruxaria e a magia eram encarados como grandes perigos morais e religiosos e perturbavam a pureza da fé cristã. É preciso dizer que Lutero “proclamava ódio aos “possuídos pelo demônio”, que no seu entender, deviam ser lapidados antes de enviados à fogueira; e o mesmo foi o pensamento de Calvino” (Gonzaga, p. 165). Isso mostra a cultura da época que atingia a todos.

Em nossos dias nenhum teólogo afirma que o demônio pode efetuar o ato sexual. Ele é puro espírito. Os antigos, porém, tinham dificuldade de conceber um espírito puro, isento de corpo, ainda que etéreo. Os estoicos imaginavam o pneuma divino como algo de corpóreo a penetrar o mundo material. Os judeus iam mais longe: admitiam que os anjos tivessem pecado sexualmente com mulheres, dando ocasião ao dilúvio narrado em Gn 6-9.

“Naquele tempo viviam gigantes na terra, como também daí por diante, quando os filhos de Deus se uniam às filhas dos homens e elas geravam filhos. Estes são os heróis, tão afamados nos tempos antigos.”


Dom Estevão Bettencourt assim analisa o texto:


“A tradição rabínica e as primeiras gerações cristãs interpretaram “os filhos de Deus” como sendo os anjos, que se teriam unido a mulheres, de modo a gerar descendentes. Tal modo de ver foi consignado (citado), mas não abonado, pelos escritos no Novo Testamento; ver Jd 6; 2Pd 2,4. Com o tempo caiu em descrédito, de sorte que no século IV já era contestado por autores cristãos. É de notar que os anjos não podem ter cópula carnal com mulheres visto que não têm corpo. A interpretação correta vê nos “filhos de Deus” uma população fiel à Lei do Senhor e nas “filhas dos homens” a população infiel ou – como dizem alguns, querendo mais precisão – tratar-se-ia de setitas e cainitas.” (ver Gn 4, 17-24 e 5, 1-32)” (PR, Nº 526 – Ano 2006 – p. 159).

Na Tradição cristã, esta concepção esteve presente até o fim da Idade Média, como se vê; mas nunca foi dogma de fé, apenas tese comum, afirma D. Estevão.

Mas, como o povo assim pensava e acreditava na existência de íncubos e súcubos (demônios machos e fêmeas, respectivamente, que podiam ter relações sexuais com mulheres ou homens), reagia energicamente contra esse grande mal; o faziam de boa fé, embora estivessem errados.

Por “feiticeira” ou “bruxa” entendia-se, naquela época, uma mulher que tinha relação sexual com um demônio masculino (íncubo) ou um homem que tinha relações com um demônio feminino (súcubo). Dessas relações nasceriam filhos enfeitiçados e malvados. Essa mentalidade surgiu com os povos pagãos do norte, os bárbaros celtas; mas penetrou fortemente no cristianismo da Idade Média depois que o rei Carlos Magno (†814) dominou os anglos saxões do norte. Ali havia as feiticeiras druidas.

Essa crença muito antiga se espalhou por toda a Europa cristã num tempo em que a superstição ainda se misturava com a fé da Igreja. A bruxaria era algo visto como terrível. A Igreja combatia essa superstição e condenava a perseguição às bruxas.


Em 19 de abril de 1080, o Papa Gregório VII (1073-1085), enviou uma carta ao rei Hoakon da Dinamarca em que condenava e perseguia a bruxaria existente naquele país. Esta carta está no artigo do Prof. Gustav Henningsen (Atas do Simpósio do Vaticano – La Inquisicion ey las Brujas, p. 595). Nela o Papa S. Gregório VII censurou o rei da Dinamarca (Hoakon) por ter mandado queimar mulheres acusadas de bruxaria, queixando-se de se culpar certas mulheres de causar tempestades e epidemias e todos os males, e matá-las de modo bárbaro. O Papa pediu ao rei que ensinasse o povo que aquelas desgraças eram vontade de Deus, as quais deveriam ser aplacadas com penitências e não castigando as mulheres.

Um beneditino de Weihenstephan revoltou-se contra a execução de três mulheres acusadas de bruxaria, e diz que elas foram “mártires da loucura do povo”. Em 1280, a pedido do bispo de Valência, na Espanha, Arnaldo Villeneuve redigiu um tratado contra essas aberrações. Isto mostra que não partiu e nem começou com a Igreja a ideia de lançar as bruxas nas fogueiras, mas era uma iniciativa do povo e dos governantes.

Dez anos depois se tentou no reino católico da Hungria, por edito de lei, acabar com a crença nas bruxas, em decreto promulgado pelo rei Colomon (1095-1114).

“Houve queima de bruxas pelo povo em 1024 em Souzdal, em 1071 em Rostov, e em 1227 em Novgorod. Em 1153 um viajante árabe Abu Hamid al-Gharnati, visitou Kiev e descreveu como as bruxas eram submetidas às ordálias da água: “Aquelas que se mantinham na superfície eram declaradas bruxas e queimadas, as que afundavam ficavam limpas e eram colocadas em liberdade.” (Atas, SV, p. 549).

Segundo o historiador Gustav Henningsen, também na Rússia a Igreja condenou a crença nas bruxas. Durante um período de fome em Vladimir, entre 1271 e 1274, o bispo Serapião pregou contra a ordália da água e condenou como superstição o costume de atribuir a causa de catástrofes naturais às bruxas. (idem)

É importantíssimo notar o que Henningsen afirmou no Simpósio:

“O certo é que muito ao contrário do que se crê, as perseguições às bruxas não foram por iniciativa da Igreja, mas manifestação de uma crença popular, cuja bem documentada existência se remonta à mais longínqua Antiguidade”. (idem, p. 568).

“Há novos testemunhos sobre perseguição de bruxas sem o consentimento da Igreja”. E ainda: “Não encontramos nada sobre as bruxas nos primeiros manuais do Santo Ofício” (S V, p. 569).


Henningsen, especialista na questão, analisa o medo da bruxaria como uma crença popular com base em um sistema de ideias mágicas de certas pessoas que, se supõe, ameaçam destruir a sociedade por dentro. A maioria dessas pessoas são mulheres, mas há também homens. Considera-se que essas pessoas têm um poder natural inato, não adquirido por técnicas, mas herdado, ou obtido mediante pacto com demônios. Por isso, acreditava-se que o simples toque, olhar, de uma bruxa podia fazer mal à pessoa. Isso provocava pânico na sociedade da época.

Henningsen mostra que o fenômeno das bruxas é algo quase universal; eles afirmam que pode-se comprovar que há algo comum na bruxaria europeia, asiática e africana; como por exemplo: as reuniões noturnas secretas das bruxas, com a celebração de banquetes à base de carne de seus próprios parentes; com um poder inato para fazer mal aos outros; o poder delas se transformarem em animais e voar pelos ares; deixar na cama um corpo falso em lugar do seu corpo enquanto vai à reunião noturna das bruxas; e outras coisas.

Ainda hoje a bruxaria continua em muitos lugares. A Revista Veja (n.2106 – 01/04/2009; p. 52) trouxe a seguinte afirmação de Ziada Nsembo, secretária geral da Fundação de Albinos da Tanzânia, falando do assassinato de albinos em rituais de bruxaria em nossos dias: “Os bruxos pedem muito dinheiro para fazer a bebida com os corpos dos albinos”.

A Crônica de Graz na Áustria, em 1115, fala de “30 mulheres que foram queimadas no mesmo dia”, pelo povo, sem a aquiescência da Igreja.

Entende-se que isso era fruto da falta de conhecimentos científicos que hoje temos e também por causa dos grandes sofrimentos do homem medieval (pestes, guerras, doenças, invasões bárbaras, saques, etc.). O misticismo acabava vendo no demônio quase o único culpado de todos os males. Daí o rigor para punir quem tivesse parte com ele. Assim, bruxos e bruxas se tornaram como que os “bodes expiatórios” para o povo desabafar seus males.

Um caso citado no Dicionário de Teologia Católica, francês, (DTC) é esclarecedor; afirma que:

“Em 15.10.1346 a Inquisição de Exilles (Dauphiné, França) sentenciou um mago por quatro delitos. Confesso e arrependido, ele recebeu apenas penitência de jejuns e peregrinações. Mas a “Cour maige” (Corte de magia) civil também o processou e o condenou à morte por 15 delitos, dos quais citamos os seguintes: 1) Teve relações com o demônio; 2) renegou a Deus e pisou a cruz com os pés; 3) escutou os conselhos do demônio; 4) o demônio proibiu-o de beijar a cruz. Estes quatro delitos são mencionados nas sentenças dos dois tribunais, mas o tribunal leigo continua: Compôs pós mágicos; cometeu malefícios e assassinou crianças; foi ao “sabat”; cometeu envenenamentos…” (Bernard, p. 13)

A maioria do povo era supersticioso, a pureza do Evangelho ainda não havia dominado a cultura; e as pessoas viam nos magos e bruxas seus maiores inimigos, por isso praticavam inúmeras violências e mortes desses na fogueira, contra a vontade da Igreja. Alguns adversários da Igreja falam absurdamente em “milhões” de bruxas queimadas na fogueira da Inquisição. É uma acusação anti-histórica como ficou claro no Simpósio do Vaticano.


A partir do século XV a questão das bruxas intensificou de tal forma que a Igreja atuou com mais vigor.

Quase a metade dos 200 processos por bruxaria na Alemanha, ficaram aos cuidados de dois inquisidores alemães: Jacob Sprenger (1436-1495) e Heinrich Institores (1432-1492). A sua rígida perseguição às bruxas no Sul da Alemanha provocou a oposição das autoridades civis e eclesiásticas. Os dois inquisidores, porém, apelaram para o Papa Inocêncio VIII (1484-1492), que respondeu com a bula “Summis Desiderantes Affectibus”, de 5 de dezembro de 1484, bula na qual enumera os malefícios causados pelas bruxas. Entre outras coisas diz a Bula:

“Inocêncio Bispo, Servo dos Servos de Deus, para a perpétua recordação dos fatos… Recentemente chegou aos nossos ouvidos, não sem nos molestar profundamente, a notícia de que em territórios da Alemanha Setentrional (províncias da Mogúncia, Colônia, Tréviris) assim como nas províncias, cidades, terras e nos locais de Salzburg e Bremen, várias pessoas de ambos os sexos, esquecidas de sua salvação desviadas da fé católica tem relações com demônios íncubos e súcubos e mediante encantamentos, canções renegam sacrilegamente a fé do seu Batismo… por instigação do inimigo do gênero humano…”. “Matam as crianças no ventre das mães, assim como os fetos do gado, tiram a fertilidade dos campos, destroem as vinhas e as uvas, enfeitiçam os homens, mulheres e animais… fazem fracassar as plantações e pomares, pastos, trigais e outras plantas; além de molestar e torturar homens e mulheres com espantosos e terríveis sofrimentos e dolorosas enfermidades internas e externas…” O texto completo pode ser lido no Anexo 2 das Atas do Simpósio do Vaticano, p. 596.

Esta bula papal foi colocada em anexo no Manual de Heinrich Institoris e Jacob Sprenger e teve milhares de cópias a partir de 1468. A partir daí houve forte perseguição às bruxas no século XVI, na Itália, França e Alemanha, com milhares de vítimas.

Em sua Bula InocêncioVIII dá seu apoio a Kramer e Sprenger:

“E embora nossos queridos filhos Heinrich Kramer e Johann Sprenger… tenham sido por cartas Apostólicas delegados como Inquisitores… Nós decretamos… que os acima citados inquisidores tenham poderes para proceder à justa correção, prisão e castigo de qualquer pessoa, sem folga ou embaraço”. (Baigent, p. 123)

Havia uma ênfase exagerada na época entre os protestantes e católicos em relação à ação do demônio. É preciso notar que não se tinha na época uma noção correta como a teologia tem hoje sobre o demônio e seus poderes, bem como sua ação no mundo. Não havia naquele tempo a psicologia, a neurologia, a psiquiatria, a psico-análise, etc, que ajudam a discernir melhor casos reais de possessão diabólica, de problemas mentais e psicológicos.

O historiador W. Neuss diz que a razão deste pânico demoníaco consistia também na decadência religiosa da época:

“… onde a ação repressiva contra a bruxaria continuava na competência da Inquisição, como na Itália e Espanha, não as produziram perseguições de notável importância. Só depois da cisão religiosa pela Reforma, principalmente no século XVII, elas deviam – primeiro na Alemanha e propagadas dali nos demais países do Norte – celebrar suas horrendas orgias”. (Bernard, p. 26)

O inquisidor Heinrich Kramer era um dominicano que, por volta de 1474, foi nomeado inquisidor em Salzburgo e no Tirol; e em 1500 foi nomeado Núncio Papal e inquisidor para a Boêmia e Moravia. J. Sprenger, também dominicano, foi prior do convento da Ordem em Colônia e nomeado inquisidor para as províncias de Colônia, Mainz e Treveris. Em 1480 tornou-se diretor de toda a província germânica da Ordem.

Kramer e Johann Sprenger redigiram o “Malleus Maleficarum”, o “Martelo das bruxas”, com mais de 500 páginas. Em 1520 já havia treze edições. O livro se propõe a mostrar as manifestações da bruxaria, para os juízes, magistrados e autoridades seculares; fornece fórmulas de exorcismo. Tornou-se um manual para os inquisidores e “era aceito não só pela legislatura católica, como também pela protestante” (Baigent, p. 125).

O Manual refere-se a várias práticas de bruxaria. Crianças que são assassinadas, cozinhadas e comidas nos Sabás das bruxas, o espetamento de alfinetes em imagem de cera, o sexo com o demônio incubo, etc.

O “Malleus Maleficarum”, em consonância com a Bula de Inocêncio VIII, de 1486, afirma que: “Esta pois é a nossa proposta: os demônios, com sua arte, causam maus efeitos por meio da bruxaria, mas é verdade que, sem a ajuda de algum agente, não podem fazer nenhuma forma… e não afirmamos que podem afligir danos sem a ajuda de algum agente, mas com um tal agente doenças, e quaisquer paixões ou males humanos, podem ser causados, e estes são reais e verdadeiros” (idem, p.126).

Para esses inquisidores o demônio é impotente sozinho, e só pode fazer o mal por meio de uma pessoa humana. E através das bruxas podiam causar os males citados pelo Papa em sua Bula. Acreditava-se que podiam por exemplo: causar chuvas de granizo e tempestades, causar impotência e esterilidade em homens e animais, causar pragas, doenças, assassinar crianças como oferendas aos demônios, levar um cavalo a enlouquecer sob o cavaleiro, causar grande amor ou ódio entre os homens, matar homens ou animais com um olhar (mau olhado), revelar o futuro, viajar pelos ares. Era o contexto da época onde a ciência era pouco desenvolvida.

O Malleus garante que as bruxas “não podem fazer mal aos inquisitores e outras autoridades, porque eles ministram justiça pública” (idem, p. 127).

“Existem três classes de homens abençoados por Deus, aos quais essa detestável raça não pode fazer mal com sua bruxaria. E a primeira são os que ministram a justiça pública contra eles, ou os processam em qualquer condição oficial pública. A segunda são aqueles que, segundo a tradição e os santos ritos da Igreja, fazendo uso legal do poder e virtude que a Igreja, com seu exorcismo, fornece na aspersão da Água Benta, na tomada do sal consagrado, no porte de velas bentas… a terceira classe são aqueles que, de várias e infinitas formas, são abençoados pelos Santos Anjos… Pois os exorcismos da Igreja são para esse mesmo propósito, e remédios inteiramente eficazes para preservar-nos dos males das bruxas” (idem, 127).

O Malleus é fortemente motivado pela ação do demônio:

“Pois quando as moças são corrompidas, e foram desprezadas por seus amantes, após terem imodestamente copulado com eles, na esperança e promessa de casamento com eles, e viram-se desapontadas em todas as suas esperanças e em toda parte desprezadas, se voltam para a ajuda e proteção dos demônios” (idem, p. 128).

Os autores do Malleus parecem ter visto na imensa gravidade do ato sexual com um espírito desencarnado, como que uma tentativa de simular a concepção milagrosa de Jesus no seio da Virgem Maria, por obra do Espírito Santo; e aí parece estar a gravidade do pecado. Não nos esqueçamos que a teologia também evolui como toda ciência.

Baigent e Leigh afirmam que a perseguição em massa às bruxas continuava, fanaticamente, também por parte dos protestantes (p. 153).

sábado, setembro 17, 2016

São Gabriel Possenti. O santo pistoleiro.

São Gabriel Possenti

Em 1860, após a batalha de Castelfidardo, cerca de vinte mercenários renegados, ligados ao exército de Garibaldi, apareceram na cidade para pilhá-la e aterrorizar os moradores. Irmão Gabriel, com a autorização do reitor do seminário, caminhou desarmado para o centro da cidade para enfrentar os terroristas. Um dos mercenários, que estava prestes a violentar uma jovem, ridicularizou-o por vir sozinho enfrentá-los.

São Gabriel Possenti
Possenti, numa rápida manobra, tirou o revólver da cintura do mercenário e ordenou que ele soltasse a mulher. Enquanto o homem obedecia ele rendeu outro soldado que se aproximava e apropriou-se de outro revólver. Ao verem o que estava acontecendo, os demais mercenários acorreram em defesa dos companheiros para subjugar o impertinente monge.

Nesse momento, uma pequena lagartixa atravessou a rua entre Possenti e a tropa que se aproximava. Quando por um breve momento o animal parou, Possenti fez pontaria e matou-o com um único tiro certeiro. Apontando agora os dois revólveres para os mercenários, Possenti ordenou que todos largassem suas armas imediatamente. Diante da exibição de pontaria, os soldados obedeceram. Possenti ordenou, também, que eles apagassem todos os focos de incêndio que haviam iniciado e que deixassem a cidade imediatamente.

Após a retirada dos mercenários, o povo agradecido levou Possenti nos braços até o seminário chamando-o de "O salvador de Isola".

Possenti queria ser enviado para as Missões após sua ordenação, entretanto morreu muito jovem, em 1862, aos 24 anos.

quarta-feira, setembro 14, 2016

O que fazer para o namoro dar certo?


Confira 9 dicas do Papa Francisco para que o namoro não seja tempo de frustração

Namoro é tempo de crescer no amor. Com frequência, Papa Francisco encontra recém-casados e sempre lhes diz: “Vocês são corajosos!”, porque assumir um compromisso definitivo requer coragem. Estatísticas têm apontado diminuição dos casamentos, e os jovens não estão querendo se casar. Por esse motivo, dedico um espaço a esse medo do casamento. Então, vamos lá, levantar alguns conselhos valiosos para que o namoro seja um tempo de crescer no amor. [grifos nossos]

1 – Medo do “Prometo ser fiel”

O amor não pode ser entendido apenas como um sentimento ou um estado psicofísico, mas sim como uma relação, uma realidade que cresce e, portanto, constrói-se como uma casa.

2 – Como edificar um lar seguro?

A construção de uma casa deve ser conjunta. Por isso, é necessário favorecer e ajudar no crescimento mútuo. Esse crescimento, que começa no namoro, não deve ter como base a areia dos sentimentos que vêm e vão; precisa ser construído sobre a rocha do amor verdadeiro que vem de Deus. O Senhor é estável e para sempre, assim o amor que funda a família deve ser estável e para sempre.

3 – Regras para viver em harmonia

Viver juntos é uma arte. “Um caminho paciente, bonito e fascinante, que não termina quando se conquista um ao outro”, afirma o Papa. O dia a dia é feito de regras que se podem resumir em três palavras: licença, desculpe e obrigado. “Peçamos ao Senhor que nos faça entender a lei do amor. Que bom é ter essa lei! Quanto bem nos faz amarmo-nos uns aos outros contra tudo! ”, diz na Encíclica Evangelii Gaudium.

4 – Como encontrar o par perfeito?
Não existe marido ou esposa perfeitos; portanto, não existe família perfeita. O que existe são pessoas pecadoras. O segredo para lidar com esses limites está em “nunca terminar um dia sem pedir perdão ao outro, sem deixar que a paz regresse na nossa casa”. Esse caminho de perdão possibilita que o matrimônio dure, vá para frente.

5 – Deixar-se amar e surpreender

“O verdadeiro amor é amar e deixar-me amar”, foi o conselho de Francisco aos jovens filipinos, em 2015. O amor é sempre uma surpresa, porque supõe um diálogo entre o que ama e o que é amado.

6 – Sonhe com as qualidades do outro

É preciso sonhar com as bondades e as qualidades do cônjuge. “Quantas dificuldades na vida do casal são solucionadas quando há espaço para o sonho! Quando numa família se perde a capacidade de sonhar, o amor não cresce e a vida enfraquece e apaga-se. É muito importante sonhar”, ensina.

7 – O amor de cada dia

Assim como se reza na oração do Pai Nosso – “O pão nosso de cada dia nos dai hoje”, os casais podem dizer: “O amor de cada dia nos dai hoje”.

8 – Dê leveza ao relacionamento

“De todas as coisas, o que mais pesa é a falta de amor. Pesa não receber um sorriso, não ser recebido. Pesam certos silêncios. Sem amor, o esforço torna-se mais pesado, intolerável”.

9 – Como deve ser a festa de casamento?

“Devem celebrar como uma verdadeira festa”, orienta o Santo Padre. Deve ser uma festa cristã, não mundana. O que deve predominar é a sobriedade, fazendo sobressair o que é realmente importante. Algumas pessoas ficam muito preocupadas com os sinais exteriores do banquete, fotografias, roupas e flores. “Essas coisas são importantes numa festa, mas somente se forem capazes de indicar o verdadeiro motivo da alegria: a bênção do Senhor sobre o amor”, destaca. Como em Caná, os sinais exteriores da festa devem revelar a presença do Senhor e recordar a origem e o motivo da alegria.

Namorar certo dá certo

Apesar da insegurança, constituir uma família está no topo de todos os indícios de satisfação entre os jovens. Só que eles, por medo de errar, rejeitam inclusive cogitar essa possibilidade. Atenção: não se deixe levar por essas ideias. Todos os argumentos da atualidade para evitar o matrimônio são falsos. A maioria dos jovens sonha com um lar feliz. 

segunda-feira, setembro 12, 2016

Uma demonologia bíblica


Um dos grandes mistérios da teologia judaico-cristã é a existência do mal, porque Deus permitiu o seu surgimento e existência, os detalhes sobre a sua origem. Dois fatos, porém, são claros: ele existe e ele será derrotado.

Textos como os de Ez. 28,12 – 15 e Lc.10,18 indicam que houve uma rebelião liderada por um anjo de luz (lúcifer), que, exercendo o seu livre arbítrio, optou pelo não-bem e pela ruptura de comunhão contra o Criador. Deus cria um lugar-estado (inferno) e para lá os lança (II Pe. 2,4).

O chefe desses anjos caídos é denominado de lúcifer ou satanás (hebraico = adversário), recebendo outros, como: belzebu, belial, o maligno, o príncipe deste mundo, diabo (grego = instigador, acusador).

Satanás lidera os demônios que:

1. São seres espirituais com personalidade e inteligência. Como súditos de satanás, inimigos de Deus e dos seres humanos (Mt.12,43 – 45);

2. São malignos, destrutivos e estão sob a autoridade de Satanás.

3. São numerosos (Mc. 5,9; Ap. 12,41).

Eles mantêm a forma angélica, com a natureza voltada para o mal. Têm inteligência e conhecimento, mas não podem conhecer os pensamentos íntimos das pessoas e nem obrigá-los a pecar.

Há autoridade e organização no mundo inferior (Mt. 25,41), mas por não ser Satanás onipresente, onipotente e onisciente (atributos exclusivos de Deus), ele age por delegação a seus inúmeros demônios (Mt. 8,28; Ap.16,1 – 14).

A teologia cristã tem percebido, a partir da Bíblia e da experiência, os seguintes ministérios demoníacos:

a) indução à desobediência a Deus e aos seus mandamentos;

b) propagação do erro e da falsa doutrina;

c) indução à mentira (“pai da mentira”) e à corrupção;

d) provocação de rebeldia nas pessoas que sofrem provações;

e) influência negativa sobre o corpo, os sentidos e a imaginação;

f) influência sobre os bens materiais (apego vs. perda);

g) realização de efeitos extraordinários, com aparência de milagres;

h) indução a sentimentos negativos, como o temor, a angústia e o ódio;

i) promoção da idolatria, da superstição, da necromancia, da magia, do sacrilégio e do culto satânico.

O mal esteve agindo no Pecado Original (queda), e exerce continuamente a sua obra perversa até o fim dos tempos, como tentador (Gn. 3,1 – 5), caluniador (Jó.1,9 – 11), causador de enfermidades (Jó. 2,7) e arquienganador (Mt. 4,6).

Ele mantém permanente luta contra Deus e o seu povo, procura desviar os fiéis de sua lealdade a Cristo (II Co. 11,3), induzindo-os a pecar e a viver segundo os sistemas elaborados pela natureza corrompida ou “carne” (I Jo. 5,19).

Os cristãos devem conhecer, pelo estudo da Bíblia e da teologia, a natureza e o ministério do mal, para se conscientizarem e se precaverem.

O apóstolo Paulo nos exorta a nos fortalecer em Deus e no seu poder, resistindo firmes pois “a nossa luta não é contra os seres humanos, mas contra os poderes e autoridades, contra os dominadores desse mundo de trevas, contra as forças espirituais do mal nas regiões celestiais” (Ef.6:12).

A disciplina devocional, com a leitura da Bíblia, a oração, os sacramentos, a busca de santidade, o desenvolvimento dos dons, a comunhão do Corpo, são antídotos contra o mal.

O ministério demoníaco contra as pessoas pode se dar de três maneiras:

a) tentação: apoio a opções negativas e atinge todos os seres humanos;

b) indução: (também chamada obsessão), uma ação mais íntima e contínua de “assessoria” à maldade, que atinge os descrentes e os crentes carnais;

c) possessão: quando os demônios se apoderam de corpos, controlando-os. Para a teologia evangélica clássica isso não pode acontecer a um convertido, cujo corpo é habitado pelo Espírito Santo.

Satanás e os demônios têm poder sobre os perdidos nesta vida e após a morte, que se destinam ao inferno.

Devemos estar advertidos para não cair em um dualismo de fundo zoroastrista. Satanás não é um ente contrário comparável a Deus.

Quem combate contra ele é o chefe dos anjos bons, e são os anjos bons que combatem os anjos maus.

Não devemos nem minimizar, nem maximizar o ministério do maligno]

Ele já foi derrotado na cruz, e o sangue de Cristo já tem poder, a obra da expiação já foi realizada, Cristo já ressuscitou e o Espírito Santo já foi enviado. O resgate já se deu, é oferecido pela Graça e recebido pela fé. O Senhor já reina sobre o universo, a História e a sua Igreja.

A perfeição da Ordem Criada (Éden) será revivida na Ordem Restaurada (Nova Jerusalém).

O mal terá um fim, quando satanás e os demônios forem todos lançados no lago do fogo (Mt. 25,41), também chamado de “segunda morte” (Ap. 20,14).

Devemos evitar cair na irresponsabilidade moral atribuindo aos demônios os males que são fruto de nossa opção, com natureza caída e pecadores. Não sejamos, portanto, ”caluniadores de satanás”.

O racionalismo e o liberalismo teológico haviam negado a existência de Satanás e dos demônios.

A teologia conservadora clássica (como fizera com os anjos bons), afirmava a sua existência, mas pouco elabora na prática do cotidiano dos fiéis. O pós-pentecostalismo e a teologia da “batalha espiritual” os vulgarizou e hipertrofiou o seu poder, além de, em uma atitude irracional, anti-científica e anti-bíblica, atribuir tudo aos mesmos. Nem indiferenças, nem irresponsabilidade, nem angústia opressiva.

Devemos rejeitar as representações pictóricas aterradoras (fruto da imaginação dos artistas), pois o mal não é incompetente em “marketing” ou em “relações públicas”, podendo aparentar beleza, bondade e prodígio.

O mal, que ele nos tenta, pode estar em nosso caráter, em nosso temperamento, e em nossa ética.

Devemos evitar o dualismo de fundo bramânico, entre “alma” (boa) e “corpo” (ruim). O ser humano foi criado integrado, caiu integrado e é restaurado integrado. “Carne” na Bíblia não é igual a Corpo (muito menos a sexualidade) mas a natureza caída (integrada). Lutero disse: “Jesus veio em carne e não pecou; Satanás não tem carne e peca todo o tempo”.

A Palavra e o Espírito vão nos libertando dos condicionamentos culturais e nos forjando como “novas criaturas”. A presente ordem, e o poder do mal, são transitórias. A nossa esperança é escatológica, “pois a antiga ordem já passou” (Ap. 21,4b).

Conclusões

Com o ocaso da modernidade vão-se os seus mitos: a bondade natural, o progresso, a razão (ciência) e as utopias globais. Volta a ambigüidade moral (e o pecado), os avanços e as decadências, a sensação de limitação nos empreendimentos e instituições humanas, e a redescoberta do além-razão no ser humano: o místico, o estético, o erótico, o lúdico, o intuitivo etc.

Há uma redescoberta do antes desvalorizado. A construção do futuro, porém, não se faz com um mero retorno ao passado (e aos seus males). O angélico e o demoníaco voltam como temas e realidades, vencendo-se, porém, os “sincretismos protestantes” e as “superstições evangélicas”, estranhas ao espírito e a proposta da Reforma.

Nem o reducionismo psicanalítico, nem o reducionismo dos “cultos de descarrego”.

A consciência do místico, do transcendente e do espiritual, não nos leva à alienação da História e das nossas responsabilidades como cidadãos e pessoas plenas.

Pois o bem e o mal, e suas potestades, se relacionam com os poderes políticos históricos, como procurou demonstrar Agostinho de Hipona em sua “Cidade de Deus”.

Fonte: Padre Felix

A doutrina da predestinação


A Igreja católica, seguindo santo Agostinho (A graça e O livre arbítrio 1,1; Sermão 169, 11,13), santo Tomás e tantos outros teólogos aceita a predestinação dos eleitos ao paraíso, mas também afirma a liberdade da vontade humana, distinguindo-se dessa forma do calvinismo. Predestinação ao inferno, no catolicismo, sempre envolverá o livre arbítrio do homem e os pecados previstos, sendo ele mesmo responsável pela sua própria condenação, e não Deus (rejeição da dupla predestinação).

Deus é soberano, em nossa visão, tanto quanto para o protestantismo (em particular o calvinismo), e como será amplamente demonstrado a seguir. Tudo o que se discute é a complexidade da contradição entre a graça e o livre arbítrio, que é uma das mais difíceis e misteriosas questões tanto para a teologia cristã quanto para a filosofia teísta. É claro, a concessão do livre arbítrio também está presente nas igrejas luteranas, anglicanas, metodistas, a maioria dos carismáticos, teologia batista não-denominacional, etc.

A Igreja Católica afirma a predestinação como dogma de fide (o maior nível de certeza teológica), e ao mesmo tempo afirma o livre arbítrio e a possibilidade da queda pelo abandono da fé. O material a seguir foi retirado do livro do teólogo alemão Ludwing Ott Fundamentos do dogma católico (Rockford, IL: TAN Books, 1974 (orig. 1952), pp. 242 - 245) e serve para que os protestantes busquem conhecer o que os católicos crêem sobre esta sempre misteriosa, controversa, complexa, grandiosa e abstrata questão teológica:

1. DEUS, PELA SUA ETERNA DETERMINAÇÃO, TEM PREDETERMINADO CERTOS HOMENS À BEM-AVENTURANÇA ETERNA (De fide)

[De fide = "de fé" – dogma absolutamente aceito por todos os católicos]

Esta doutrina está proposta pelo ordinário e geral ensinamento da Igreja como verdade revelada. As definições doutrinárias do Concílio de Trento pressupõem... A realidade da predestinação está claramente atestada em Rm. 8,29 e seguintes: ... cf. Mt. 25,34; Jo 10,27 e seguintes; At. 13,48; Ef. 1,4 e seguintes... A predestinação faz parte do plano divino da Eterna Providência.

2. BASES DA PREDESTINAÇÃO

a) O Problema

A dificuldade principal reside na questão se a decisão eterna da Deus da predestinação tem sido tomada com ou sem os méritos do homem (antes ou depois do praevisa merita)

Somente a predestinação incompleta é independente de qualquer mérito (ante praevida merita), porque a primeira graça não pode ser merecida, e a graça conseqüente, bem como os méritos adquiridos com esta graça e suas recompensas, dependem como os elos de uma corrente, da primeira graça...

b) Tentativa de solução

Os tomistas, os agostinianos, a maioria dos escotistas e também molinistas (Suarez, São Belarmino) ensinam uma predestinação absoluta (ad gloriam tantaum), portanto uma ante praevisa merita. De acordo com eles, Deus livremente determina por toda a eternidade, independente dos méritos da graça do homem, a chamar certos homens à bem-aventurança e conseqüentemente concede a eles graça que os guiará infalivelmente à correta execução do Decreto Divino (ordo intentionis). Deus primeiramente concede aos predestinados graças efetivas e felicidade eterna como uma retribuição pelos méritos que fluem de suas livres cooperações com a graça (ordo executionis). O ordo intentionis e o ordo executionis estão em relação inversão um com o outro (glória – graça; graça – glória).

A maioria dos molinistas, e também São Francisco de Sales (+1622) ensinam uma predestinação condicionada (ad gloriam tantum), que é, postand popter praevisa merita. De acordo com eles, Deus, por sua scientia media, vê antecipadamente qual homem irá reagir livremente às várias disposições da graça. À luz desse conhecimento Ele escolhe, como Lhe agrada, uma fixa e definida disposição da graça. Agora, por Sua scientia visionis, Ele conhece por antecipação e infalivelmente qual o uso que cada homem fará com a graça concedida a ele. Então Ele elege à bem-aventurança eterna aqueles que por virtude de seus méritos previstos cooperam perseverantemente com a graça, enquanto Ele determina à punição eterna do inferno aqueles que, por causa de seus méritos previstos, negam essa cooperação. A ordo intentionis e a ordo executionis coincidem (graça – glória; glória – graça).

As duas tentativas de explicação são permitidas eclesiasticamente. As provas das Escrituras não decidem por qual das duas. Os tomistas citam acima de todas as passagens a carta aos Romanos, na qual o fator divino da salvação é fortemente demonstrado em primeiro plano (Rm. 8,29; 9,11 - 13; 9,20 ss.)... Os molinistas invocam as passagens que atestam a universalidade da vontade Divina da salvação, especialmente 1 Tm. 2,4, assim como as sentenças pronunciadas pelo julgamento do mundo (Mt. 25,34 - 36), em que as obras de misericórdia são dadas como base para a aceitação no Reino de Deus. Mas que estas também são bases para a "preparação" ao Reino, isto é, para uma decisão eterna da predestinação, não pode ser definitivamente provada por eles.

Enquanto a tradição pré-agostiniana fica a favor da explicação molinista, santo Agostinho, pelo menos em suas últimas cartas, é mais a favor da explicação tomista. Esta enfatiza a causalidade universal de Deus enquanto a outra visão enfatiza a universalidade da salvação divina, a liberdade do homem e sua cooperação na salvação. As dificuldades que permanecem dos dois lados provam que a Predestinação, mesmo com uma razão iluminada pela fé, ainda é um mistério insondável (Rm. 11,33 ss.).

3. PROPRIEDADES DA PREDESTINAÇÃO

a) Imutabilidade

A decisão da Predestinação, como um ato de vontade de conhecimento divino, é uma essência divina imutável em sua essência. O número daqueles que estão registrados no livro da vida (Fl. 4,3; Ap. 17,8; cf. Lc. 10,20) está formalmente e materialmente fixado, isto é, Deus sabe e determina com certeza infalível antecipadamente como e quais os homens que serão salvos.

b) Incerteza

O concílio de Trento declarou-se contra o calvinismo, que a certeza do conhecimento da predestinação de alguém somente pode ser obtida por revelação especial... a Sagrada Escritura ordena o homem a trabalhar por sua salvação com temor e tremor (Fl. 2,12). O que acha que está no alto cuide que não caia (1 Cor 10,12). Apesar da incerteza, existem alguns sinais da predestinação que indicam uma grande possibilidade da predestinação de alguém, que podem ser a prática perseverante das virtudes recomendadas nas oito beatitudes, recepção freqüente da sagrada comunhão, amor ao próximo, amor a Cristo e à Igreja...

(Para provas contra a certeza absoluta da salvação coloco algumas passagens: 1 Cor 9,27, 10,12, Gal. 5,1,4, Fl. 3,11 - 14, 1 Tm. 4,1; 5,15; Hb. 3,12 - 14; 6,4 - 6; 2 Pd. 2,15,20 - 21. Estas são as mais contundentes, mas existem outras: 1 Sm. 11,6; 18,11 - 12; Ez. 18,24; 33,12 - 13,18, Gal 4,9; Col 1,23; Hb. 6,11 - 12; 10,23.26.29.36.39; 12,15; Ap. 2,4 - 5).

(Muitos protestantes declaram ter uma absoluta "certeza", mas quando tudo é dito e feito, tanto bíblica quanto epistemologicamente, eles simplesmente não conseguem mais chegar a esta certeza, e não estarão mais "certos" do que um católico ou um ortodoxo. Tais declarações são simplesmente improváveis. Em outras palavras, a "segurança" protestante envolve o seguinte argumento em um círculo vicioso: para possuir uma segurança da salvação você deve acreditar que está salvo. Isto tem sido chamado de "fé de confiança" e é totalmente subjetiva, da mesma forma que a "chama no seio" dos mórmons. Martinho Lutero mesmo ilustra a incoerência desta inovação:

Devemos dia após dia nos empenhar para uma maior certeza... Todos devem, portanto se acostumarem firmemente com a idéia de que está em estado de graça... Se encontrar dúvida, então deixe exercitar a fé; deve derrubar suas dúvidas e adquirir certeza... O problema da justificação é difícil e delicada, não deveras por ela mesma, pois por ela mesma há grande certeza, mas em relação a nós; isto eu tenho freqüentemente experimentado (In Hartmann Grisar, Luther, London: 1917, v.4, pp.437-443)

4. CONCEITO E REALIDADE DA REPROVAÇÃO

Por Reprovação se entende a resolução eterna de Deus em excluir certas criaturas racionais do gozo eterno. Enquanto Deus, por Sua graça, positivamente coopera nos méritos sobrenaturais, que levam à beatificação, Ele meramente permite os pecados, que levam à condenação eterna.

Em relação ao assunto da decisão da reprovação, deve-se fazer uma distinção entre a reprovação positiva e a negativa, de acordo com a decisão divina de reprovação como uma condenação objetiva ao inferno ou punição, ou exclusão da visão beatífica. Em relação à razão da reprovação a distinção é entre condicional ou incondicional, à medida que a decisão divina de reprovação é dependente ou independente da previsão dos futuros deméritos.

5 - DEUS, POR DECISÃO DE SUA VONTADE, PREDESTINA CERTOS HOMENS, EM CONTA DE SEUS PECADOS PREVISTOS, À REJEIÇÃO ETERNA (De Fide).


A realidade da reprovação não está formalmente definida, mas é um ensinamento geral da Igreja.

6. A REPROVAÇÃO POSITIVA


A doutrina herética do predestinacionismo em suas várias formas (Lucidus no século 5, Gottschalk no século 9, Wycliff, Huss e especialmente João Calvino) ensina uma predeterminação positiva para o pecado, e uma incondicional predestinação à punição eterna, isto é, sem a consideração dos futuros deméritos. Isto foi rejeitado como falsa doutrina nos Sínodos particulares de Orange, Quiercy e Valência e pelo Concílio de Trento. Reprovação Positiva Incondicional leva a uma negação da universalidade do divino desejo de salvação, e da redenção, e contradiz a justiça e santidade de Deus assim como a liberdade do homem.

De acordo com o ensinamento da Igreja, existe uma Reprovação Positiva Condicional, isto é, ocorre levando em consideração os futuros deméritos (post et propter praevisa demerita). A natureza condicional da reprovação positiva foi demandada pela generalidade da decisão divina de Salvação. Isto exclui o desejo antecipado de Deus em condenar o homem (cf. 1 Tm. 2,4; Ez. 33,11; 1 Pd. 3,9).

7. A REPROVAÇÃO NEGATIVA


Sobre a questão da reprovação, a visão tomista favorece não uma absoluta, mas somente uma reprovação negativa. Isto é concebido pela maioria dos tomistas como uma não-eleição à felicidade eterna (non-electio), juntamente com a decisão divina em permitir que algumas criaturas racionais caiam no pecado, e por isso pelas suas próprias culpas percam a salvação eterna. Em contraste com a Reprovação Positiva absoluta da predestinação, os tomistas insistem na universalidade da vontade divina da salvação e redenção, na alocação das graças suficientes para o reprovado e na liberdade do livre-arbítrio do homem. Na prática, a reprovação negativa incondicional de alguns tomistas envolve o mesmo resultado da reprovação incondicional positiva dos predestinacionistas hereges, pois fora o céu e o inferno não há outro estado final.

Da mesma forma que a decisão da predestinação, a decisão da reprovação é imutável, mas, sem uma revelação especial, sua incidência é desconhecida do homem.

Ludwing Ott
Livro: Fundamentals of Catholic Dogma - tradução: Rondinelly Ribeiro

Patrística: A criação e a queda. (por santo Atanásio)


Em nosso Livro anterior tratamos suficientemente sobre alguns dos principais pontos do culto pagão dos ídolos, e como estes falsos deuses surgiram originalmente. Nós também, pela graça de Deus, indicamos brevemente que o Verbo do Pai é Ele mesmo divino, que todas as coisas que existem devem seu próprio ser à sua vontade e poder e que é através dEle que o Pai dá ordem à criação, por Ele que todas as coisas são movidas e através dEle que recebem o seu ser.

Agora, Macário, verdadeiro amante de Cristo, devemos dar um passo a mais na fé de nossa sagrada religião e considerar também como o Verbo se fêz homem e surgiu entre nós. Para tratar destes assuntos é necessário primeiro que nos lembremos do que já foi dito. Deves entender por que o Verbo do Pai, tão grande e tão elevado, se manifestou em forma corporal. Ele não assumiu um corpo como algo condizente com a sua própria natureza, mas, muito ao contrário, na medida em que Ele é Verbo, Ele é sem corpo. Manifestou-se em um corpo humano por esta única razão, por causa do amor e da bondade de seu Pai, pela salvação de nós homens.

Começaremos, portanto, com a criação do mundo e com Deus seu Criador, pois o primeiro fato que deves entender é este: a renovação da Criação foi levada a efeito pelo mesmo Verbo que a criou em seu início. Em relação à criação do Universo e à criação de todas as coisas têm havido uma diversidade de opiniões, e cada pessoa tem proposto a teoria que bem lhe apraz. Por exemplo, alguns dizem que todas as coisas são auto originadas e, por assim dizer, totalmente ao acaso. Entre estes estão os Epicúreos, os quais negam terminantemente que haja alguma Inteligência anterior ao Universo. Outros fazem seu o ponto de vista expressado por Platão, aquele gigante entre os Gregos. Ele disse que Deus fêz todas as coisas da matéria pre-existente e incriada, assim como o carpinteiro faz as suas obras da madeira que já existe. Mas os que sustentam esta opinião não se dão conta que negar que Deus seja Ele próprio a causa da matéria significa atribuir-Lhe uma limitação, assim como é indubitavelmente uma limitação por parte do carpinteiro que ele não possa fazer nada a não ser que lhe esteja disponível a madeira. Então, finalmente, temos a teoria dos Gnósticos, que inventaram para si mesmos um Artífice de todas as coisas, outro que não o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo. Estes simplesmente fecham os seus olhos para o sentido óbvio das Sagradas Escrituras. Tais são as noções que os homens têm elaborado. Mas pelo divino ensinamento da fé cristã nós sabemos que, pelo fato de haver uma Inteligência anterior ao Universo, este não se originou a si mesmo; por ser Deus infinito, e não finito, o Universo não foi feito de uma matéria pré-existente, mas do nada e da absoluta e total não existência, de onde Deus o trouxe ao ser através do Verbo. Ele diz, neste sentido, no Gênesis: "No início Deus criou o Céu e a Terra" e novamente, através daquele valiosíssimo livro ao qual chamamos "O Pastor":

"Crêde primeiro e antes de tudo o mais que há apenas um só Deus o qual criou e ordenou a todas as coisas trazendo-as da não existência ao ser"

Paulo também indica a mesma coisa quando nos diz: "Pela fé conhecemos que o mundo foi formado pela Palavra de Deus, de tal modo que as coisas visíveis provieram das coisas invisíveis" (Heb. 11, 3)

Pois Deus é bom, ou antes, Ele é a fonte de toda a bondade, e é impossível por isso que Ele deva algo a alguém. Não devendo a existência a ninguém, Ele criou a todas as coisas do nada mediante seu próprio Verbo, nosso Senhor Jesus Cristo, e de todas as suas criaturas terrenas ele reservou um cuidado especial para a raça humana. A eles que, como animais, eram essencialmente impermanentes, Deus concedeu uma graça de que as demais criaturas estavam privadas, isto é, a marca de sua própria Imagem, uma participação no ser racional do próprio Verbo, de tal modo que, refletindo-O, eles mesmos se tornariam racionais expressando a Inteligência de Deus tanto quanto o próprio Verbo, embora em grau limitado. Deste modo, os homens poderiam continuar para sempre na bem aventurada e única verdadeira vida dos santos no paraíso. Como a vontade do homem poderia, porém, voltar-se para vários caminhos, Deus assegurou-lhes esta graça que lhes havia concedido condicionando-a desde o início a duas coisas. Se eles guardassem a graça e retivessem o amor de sua inocência original, então a vida do paraíso seria sua, sem tristeza, dor ou cuidados, e após ela haveria a certeza da imortalidade no céu. Mas se eles se desviassem do caminho e se tornassem vis, desprezando seu direito natal à beleza, então viriam a cair sob a lei natural da morte e viveriam não mais no paraíso, mas, morrendo fora dele, continuariam na morte e na corrupção. Isto é o que a Sagrada Escritura nos ensina, ao proclamar a ordem de Deus: "De todas as árvores que estão no jardim vós certamente comereis, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não havereis de comer, pois certamente havereis de morrer"

"Certamente havereis de morrer", isto é, não apenas morrereis, mas permanecereis no estado de morte e corrupção. Estarás talvez a divagar por que motivo estamos discutindo a origem do homem se nos propusemos a falar sobre o Verbo que se fêz homem. O primeiro assunto é de importância para o último por este motivo: foi justamente o nosso lamentável estado que fêz com que o Verbo se rebaixasse, foi nossa transgressão que tocou o seu amor por nós. Pois Deus havia feito o homem daquela maneira e havia querido que ele permanecesse na incorrupção. Os homens, porém, tendo voltado da contemplação de Deus para o mal que eles próprios inventaram, caíram inevitavelmente sob a lei da morte. Em vez de permanecerem no estado em que Deus os havia criado, entraram em um processo de uma completa degeneração e a morte os tomou inteiramente sob o seu domínio. Pois a transgressão do mandamento os estava fazendo retornarem ao que eles eram segundo a sua natureza, e assim como no início eles haviam sido trazidos ao ser a partir da não existência, passaram a trilhar, pela degeneração, o caminho de volta para a não existência. A presença e o amor do Verbo os havia chamado ao ser; inevitavelmente, então, quando eles perderam o conhecimento de Deus, juntamente com este eles perderam também a sua existência. Pois é somente Deus que existe, o mal é o não-ser, a negação e a antítese do bem. Pela natureza, de fato, o homem é mortal, já que ele foi feito do nada; mas ele traz também consigo a Semelhança dAquele Que É, e se ele preservar esta Semelhança através da contemplação constante, então sua natureza seria despojada de seu poder e ele permaneceria indegenerescente. De fato, é isto o que vemos escrito no Livro da Sabedoria: "A observância de Suas Leis é a garantia da imortalidade" (Sab. 6, 18)

E, incorrompido, o homem seria como Deus, conforme o diz a própria Escritura, onde afirma:"Eu disse: `Sois deuses, e todos filhos do Altíssimo. Mas vós como homens morrereis, caireis como um príncipe qualquer'" (Salmo 81, 6)

Esta, portanto, era a condição do homem. Deus não apenas o havia feito do nada, mas também lhe tinha graciosamente concedido a Sua própria vida pela graça do Verbo. Os homens, porém, voltando-se das coisas eternas para as coisas corruptíveis, pelo conselho do demônio, se tornaram a causa de sua própria degeneração para a morte, porque, conforme dissemos antes, embora eles fossem por natureza sujeitos à corrupção, a graça de sua união com o Verbo os tornava capazes de escapar na lei natural, desde que eles retivessem a beleza da inocência com a qual haviam sido criados. Isto é o mesmo que dizer que a presença do Verbo junto a eles lhes fazia de escudo, protegendo-os até mesmo da degeneração natural, conforme também o diz o Livro da Sabedoria: "Deus criou o homem para a imortalidade e como uma imagem de sua própria eternidade; mas pela inveja do demônio entrou no mundo a morte" (Sab. 2,23)

Quando isto aconteceu os homens começaram a morrer e a corrupção correu solta entre eles, tomou poder sobre os mesmos até mais do que seria de se esperar pela natureza, sendo esta a penalidade sobre a qual Deus os havia avisado prevenindo-os acerca da transgressão do mandamento. Na verdade, em seus pecados os homens superaram todos os limites. No início inventaram a maldade; envolvendo-se desta maneira na morte e na corrupção, passaram a caminhar gradualmente de mal a pior, não se detendo em nenhum grau de malícia, mas, como se estivessem dominados por uma insaciável apetite, continuamente inventando novo tipos de pecados. Os adultérios e os roubos se espalharam por todos os lugares, os assassinatos e as rapinas encheram a terra, a lei foi desrespeitada para dar lugar à corrupção e à injustiça, todos os tipos de iniqüidades foram praticados por todos, tanto individualmente como em comum. Cidades fizeram guerra contra cidades, nações se levantaram contra nações, e toda a terra se viu repleta de divisões e lutas, enquanto cada um porfiava em superar o outro em malícia. Até os crimes contrários à natureza não foram desconhecidos, conforme no-lo diz o Apóstolo mártir de Cristo: "Suas próprias mulheres mudaram o uso natural em outro uso, que é contra a natureza; e os homens também, deixando o uso natural da mulher, arderam nos seus desejos um para com o outro, cometendo atos vergonhosos com o seu próprio sexo, e recebendo em suas próprias pessoas a recompensa devida pela sua perversidade" (Rom. 1, 26-7)

Patrística: Sobre o batismo de crianças



Didaquè – a Doutrina dos Apóstolos n. 30

“Quanto ao batismo, batizai assim: depois de terdes ensinado o que precede, batizai em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo, em água corrente; se não existe água corrente, batize-se em outra água. Se não puder ser em água fria, faze em água quente. Se não tens bastante, de uma ou de outra, derrama água três vezes sobre a cabeça, em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Antes do Batismo, jejuem: o que batiza, o que é batizado e outras pessoas”.

São Ireneu (140 - 202)

“Jesus veio salvar a todos os que através dele nasceram de novo [pelo batismo] de Deus: os recém-nascidos, os meninos, os jovens, os velhos”. “O batismo nos concede a graça do novo nascimento em Deus Pai por meio do seu Filho no Espírito Santo. Pois os que têm o Espírito de Deus são conduzidos ao Verbo, isto é, ao Filho; mas o Filho os apresenta ao Pai, e o Pai lhes concede a incorruptibilidade. Portanto, sem o Espírito Santo não é possível ver o Filho de Deus, e, sem o Filho, ninguém pode aproximar-se do Pai, pois o conhecimento do Pai é o Filho, e o conhecimento do Filho de Deus se faz pelo Espírito Santo”. (Dem. 7)

Orígenes – bispo de Alexandria (184 - 285)

“A Igreja recebeu dos Apóstolos a Tradição de dar o batismo também aos recém-nascidos”. (Ep. Ad. Rom.LV, 5,9)

São Cipriano, bispo de Cartago (210 - 258)

“Do batismo e da graça não devemos afastar as crianças” (Carta a Fido)

São Gregório Nazianzeno (330 - 379) - doutor da Igreja

“Sepultemo-nos com Cristo pelo Batismo, para ressuscitarmos com Ele; desçamos com Ele, para sermos elevados com Ele; subamos novamente com Ele, para sermos glorificados nele. “(Or. 40,9)

Santo Hilário (310 - 367)

“Tudo o que aconteceu com Cristo dá-nos a conhecer que, depois na imersão na água, o Espírito Santo voa sobre nós do alto do Céu e que, adotados pela Voz do Pai, nos tornamos filhos de Deus”. (Mat. 2)

Tradição Apostólica de Hipólito (sec. III)

“Batizar-se-ão em primeiro lugar as crianças, todas aquelas que podem falar por si mesmas, que falem: quanto às que não podem fazer, os pais ou alguém de sua família devem falar por elas” (La Trad. Apostolique - ed. Botte Munster 1963 - pg. 44s).

Santo Agostinho († 430)

“As crianças são apresentadas para receber a graça espiritual, não tanto por aquelas que as levam nos braços, ... mas sobretudo pela sociedade universal dos santos e dos fiéis ... é a mãe Igreja toda, que está presente nos se os santos, a agir, pois é ela inteira que os gera a todos e a cada um”(Ep. 98,5 PL 33,362).

O Concílio de Cartago

(418), que condenou o pelagianismo, rejeitou a posição “daqueles que negam que se devam batizar as crianças recém-nascidas do seio materno” - “Também os mais pequeninos que não tenham ainda podido cometer pessoalmente algum pecado, são verdadeiramente batizados para a remissão dos pecados, a fim de que, mediante a regeneração, seja purificado aquilo que eles têm de nascença”. (Cânon 2, DS,223)

Concílio de Florença (1442)

Exigiu que fosse administrado o batismo aos recém-nascidos “o mais depressa que se possa fazer comodamente” (DS. 1349)

SERMÃO SOBRE A RESSURREIÇÃO DE CRISTO, SEGUNDO SÃO MARCOS


A ressurreição de nosso Senhor Jesus Cristo lê-se estes dias, como é costume, segundo cada um dos livros do santo Evangelho. Na leitura de hoje ouvimos Jesus Cristo censurando os discípulos, primeiros membros seus, companheiros seus porque não criam estar vivo aquele mesmo por cuja morte choravam. Pais da fé, mas ainda não fiéis; mestres - e a terra inteira haveria de crer no que pregariam, pelo que, aliás, morreriam - mas ainda não criam. Não acreditavam ter ressuscitado aquele que haviam visto ressuscitando os mortos. Com razão, censurados: ficavam patenteados a si mesmos, para saberem o que seriam por si mesmos os que muito seriam graças a ele.

E foi deste modo que Pedro se mostrou quem era: quando iminente a Paixão do Senhor, muito presumiu; chegada a Paixão, titubeou. Mas caiu em si, condoeu-se, chorou, convertendo-se a seu Criador.

Eis quem eram os que ainda não criam, apesar de já verem. Grande, pois, foi a honra a nós concedida por aquele que permitiu crêssemos no que não vemos! Nós cremos pelas palavras deles, ao passo que eles não criam em seus próprios olhos.

A ressurreição de nosso Senhor Jesus Cristo é a vida nova dos que crêem em Jesus, e este é o mistério da sua Paixão e Ressurreição, que muito devíeis conhecer e celebrar. Porque não sem motivo desceu a Vida até a morte. Não foi sem motivo que a fonte da vida, de onde se bebe para viver, bebeu desse cálice que não lhe convinha. Por que a Cristo não convinha a morte.

De onde veio a morte?

Vamos investigar a origem da morte. O pai da morte é o pecado. Se nunca houvesse pecado ninguém morreria. O primeiro homem recebeu a lei de Deus, isto é, um preceito de Deus, com a condição de que se o observasse viveria e se o violasse morreria. Não crendo que morreria, fez o que o faria morrer; e verificou a verdade do que dissera quem lhe dera a lei. Desde então, a morte. Desde então, ainda, a segunda morte, após a primeira, isto é, após a morte temporal a eterna morte. Sujeito a essa condição de morte, a essas leis do inferno, nasce todo homem; mas por causa desse mesmo homem, Deus se fez homem, para que não perecesse o homem. Não veio, pois, ligado às leis da morte, e por isso diz o Salmo: "Livre entre os mortos" [Sl 87].

Concebeu-o, sem concupiscência, uma Virgem; como Virgem deu-lhe à luz, Virgem permaneceu. Ele viveu sem culpa, não morreu por motivo de culpa, comungava conosco no castigo mas não na culpa. O castigo da culpa é a morte. Nosso Senhor Jesus Cristo veio morrer, mas não veio pecar; comungando conosco no castigo sem a culpa, aboliu tanto a culpa como a castigo. Que castigo aboliu? O que nos cabia após esta vida. Foi assim crucificado para mostrar na cruz o fim do nosso homem velho; e ressuscitou, para mostrar em sua vida, como é a nossa vida nova. Ensina-o o Apóstolo: "Foi entregue por causa dos nossos pecados, ressurgiu por causa da nossa justificação" [Rm 4,25].

Como sinal disto, fora dada outrora a circuncisão aos patriarcas: no oitavo dia todo indivíduo do sexo masculino devia ser circuncidado. A circuncisão fazia-se com cutelos de pedra: porque Cristo era a pedra. Nessa circuncisão significava-se a espoliação da vida carnal a ser realizada no oitavo dia pela Ressurreição de Cristo. Pois o sétimo dia da semana é o sábado; no sábado o Senhor jazia no sepulcro, sétimo dia da semana. Ressuscitou no oitavo. A sua Ressurreição nos renova. Eis por que, ressuscitando no oitavo dia, nos circuncidou.

É nessa esperança que vivemos. Ouçamos o Apóstolo dizer. "Se ressuscitasses com Cristo..." [Cl 3,1] Como ressuscitamos, se ainda morremos? Que quer dizer o Apóstolo: "Se ressuscitasses com Cristo?" Acaso ressuscitariam os que não tivessem antes morrido? Mas falava aos vivos, aos que ainda não morreram ... os quais, contudo, ressuscitaram: que quer dizer?

Vede o que ele afirma: "Se ressuscitasses com Cristo, procurai as coisas que são do alto, onde Cristo está assentado à direita de Deus, saboreai o que é do alto, não o que está sobre a terra. Porque estais mortos!"

É o próprio Apóstolo quem está falando, não eu. Ora, ele diz a verdade, e, portanto, digo-a também eu... E por que também a digo? "Acreditei e por causa disto falei" [Sl 115].

Se vivemos bem, é que morremos e ressuscitamos. Quem, porém, ainda não morreu, também não ressuscitou, vive mal ainda; e se vive mal, não vive: morra para que não morra. Que quer dizer: morra para que não morra? Converta-se, para não ser condenado.

"Se ressuscitasses com Cristo", repito as palavras do Apóstolo, "procurai o que é do alto, onde Cristo está assentado à direita de Deus, saboreai o que é do alto, não o que é da terra. Pois morrestes e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus. Quando Cristo, que é a vossa vida, aparecer, então também aparecereis com ele na glória". São palavras do Apóstolo. A quem ainda não morreu, digo-lhe que morra; a quem ainda vive mal, digo-lhe que se converta. Se vivia mal, mas já não vive assim, morreu; se vive bem, ressuscitou.

Mas, que é viver bem? Saborear o que está no alto, não o que sobre a terra. Até quando és terra e à terra tornarás? Até quando lambes a terra? Lambes a terra, amando-a, e te tornas inimigo daquele de quem diz o Salmo: "os inimigos dele lamberão a terra" [Sl 79,9].

Que éreis vós? Filhos de homens. Que sois vós? Filhos de Deus.

Ó filhos dos homens, até quando tereis o coração pesado? Por que amais a vaidade e buscais a mentira? Que mentira buscais? O mundo.

Quereis ser felizes, sei disto. Dai-me um homem que seja ladrão, criminoso, fornicador, malfeitor, sacrílego, manchado por to- dos os vícios, soterrado por todas as torpezas e maldades, mas não queira ser feliz. Sei que todos vós quereis viver felizes, mas o que faz o homem viver feliz, isso não quereis procurar. Tu, aqui, buscas o ouro, pensando que com o ouro serás feliz; mas o ouro não te faz feliz. Por que buscas a ilusão? E com tudo o que aqui procuras, quando procuras mundanamente, quando o fazes amando a terra, quando o fazes lambendo a terra, sempre visas isto: ser feliz. Ora, coisa alguma da terra te faz feliz. Por que não cessas de buscar a mentira? Como, pois, haverás de ser feliz? "Ó filhos dos homens, até quando sereis pesados de coração, vós que onerais com as coisas da terra o vosso coração?" [Sl 4,3] Até quando foram os homens pesados de coração? Foram-no antes da vinda de Cristo, antes que ressuscitasse o Cristo. Até quando tereis o coração pesado? E por que amais a vaidade e procurais a mentira? Querendo tornar-vos felizes, procurais as coisas que vos tornam míseros! Engana-vos o que descaiais, é ilusão o que buscais.

Queres ser feliz? Mostro-te, se te agrada, como o serás. Continuemos ali adiante (no versículo do Salmo): "Até quando sereis pesados de coração? Por que amais a vaidade e buscais a mentira?" "Sabei" - o quê? – "que o Senhor engrandeceu o seu Santo" [Sl 4,3].

O Cristo veio até nossas misérias, sentiu a fone, a sede, a fadiga, dormiu, realizou coisas admiráveis, padeceu duras coisas, foi flagelado, coroado de espinhos, coberto de escarros, esbofeteado, pregado no lenho, traspassado pela lança, posto no sepulcro; mas no terceiro dia ressurgiu, acabando-se o sofrimento, morrendo a morte. Eia, tende lá os vossos olhos na ressurreição de Cristo; porque tanto quis o Pai engrandecer o seu Santo, que o ressuscitou dos mortos e lhe deu a honra de se assentar no Céu à sua direita. Mostrou-te o que deves saborear se queres ser feliz, pois aqui não o poderás ser. Nesta vida não podes ser feliz, ninguém o pode.

Boa coisa a que desejas, mas não nesta terra se encontra o que desejas. Que desejas? A vida bem-aventurada. Mas aqui não reside ela.

Se procurasses ouro num lugar onde não houvesse, alguém, sabendo da sua não existência, haveria de te dizer: "Por que estás a cavar? Que pedes à terra? Fazes uma fossa na qual hás de apenas descer, na qual nada encontrarás!"

Que responderias a tal conselheiro? "Procuro ouro". Ele te diria: "Não nego que exista o que descias, mas não existe onde o procuras".

Assim também, quando dizes: "Quero ser feliz". Boa coisa queres, mas aqui não se encontra. Se aqui a tivesse tido o Cristo, igualmente a teria eu. Vê o que ele encontrou nesta região da tua morte: vindo de outros paramos, que achou aqui senão o que existe em abundância? Sofrimentos, dores, morte. Comeu contigo do que havia na cela de tua miséria. Aqui bebeu vinagre, aqui teve fel. Eis o que encontrou em tua morada.

Contudo, convidou-te à sua grande mesa, à mesa do Céu, à mesa dos anjos, onde ele é o pão. Descendo até cá, e tantos males recebendo de tua cela, não só não rejeitou a tua mesa, mas prometeu-te a sua.

E que nos diz ele?

"Crede, crede que chegareis aos bens da minha mesa, pois não recusei os males da vossa".

Tirou-te o mal e não te dará o seu bem? Sim, da-lo-á. Pro- meteu-nos sua vida, mas é ainda mais incrível o que fez: ofereceu-nos a sua morte. Como se dissesse: "À minha mesa vos convido. Nela ninguém morre, nela está a vida verdadeiramente feliz, nela o alimento não se corrompe, mas refaz e não se acaba. Eia para onde vos convido, para a morada dos anjos, para a amizade do Pai e do Espírito Santo, para a ceia eterna, para a fraternidade comigo; enfim, a mim mesmo, à minha vida eu vos conclamo! Não quereis crer que vos darei a minha vida? Retende, como penhor a minha morte".

Agora, pois, enquanto vivemos nesta carne corruptível, mor- ramos com Cristo pela conversão dos costumes, vivamos com Cristo pelo amor da justiça.

Não haveremos de receber a vida bem-aventurada senão quando chegarmos àquele que veio até nós, e quando começarmos a viver com aquele que por nós morreu.


Santo Agostinho de Hipona - "Antologia dos santos Padres"
Tradução: Cirilo Folch Gomes

Patrística: Sobre a oração pelos mortos.



Didaqué (ou doutrina dos 12 apóstolos)

“Ao fazerdes as vossas comemorações, reuni-vos, lede as Sagradas Escrituras... tanto em vossas assembléias quanto nos cemitérios. O pão duro que o pão tiver purificado e que a invocação tiver santificado, oferecei-o orando pelos mortos”.

Tertuliano († 220) – bispo de Cartago

“A esposa roga pela alma de seu esposo e pede para ele refrigério, e que volte a reunir-se com ele na ressurreição; oferece sufrágio todos os dias aniversários de sua morte” (De monogamia, 10). “... é um pensamento santo e salutar rezar pelos defuntos para que sejam perdoados de seus pecados” (2 Mac 12,46). Tertuliano atesta o uso de sufrágios na liturgia oficial de Cartago, que era um dos principais centros do cristianismo no século III: “Durante a morte e o sepultamento de um fiel, este fora beneficiado com a oração do sacerdote da Igreja”. (De anima 51; PR, ibidem)

São Cipriano († 258), bispo de Cartago, refere-se à oferta do sacrifício eucarístico em sufrágio dos defuntos como costume recebido da herança dos bispos seus antecessores (cf. epist. 1,2). Nas suas epístolas é comum encontrar a expressão: “oferecer o sacrifício por alguém ou por ocasião dos funerais de alguém”. (Revista PR, 264, 1982, pag. 50 e 51; PR ibidem)

Falando da vida de Cartago, no século III, afirma Vacandart:

“Podemos de certo modo conceber o que terá sido a vida religiosa de Cartago em meados do século III. Aí vemos o clero e os fiéis a cercar o altar... ouvimos os nomes dos defuntos lidos pelo diácono e o pedido de que o bispo ore por esses fiéis falecidos; vemos os cristãos... voltar para casa reconfortados pela mensagem de que o irmão falecido repousa na unidade da Igreja e na paz do Cristo.” (Revue de Clergé Français 1907 t. Lil 151; PR, ibidem)

São Gregório Magno (540 - 604) - papa e doutor da Igreja

“No que concerne a certas faltas leves, deve-se crer que existe antes do juízo um fogo purificador, segundo o que afirma Aquele que é a Verdade, dizendo que se alguém tiver cometido uma blasfêmia contra o Espírito Santo, não lhe será perdoada nem no presente século nem no século futuro (Mt 12,31). Desta afirmação podemos deduzir que certas faltas podem ser perdoadas no século presente, ao passo que outras, no século futuro”. (dial. 4, 39)

São João Crisóstomo (349 - 407) - bispo e doutor da Igreja

“Levemos-lhe socorro e celebremos a sua memória. Se os filhos de Jó foram purificados pelos sacrifícios de seu pai (Jó 1,5), porque duvidar que as nossas oferendas em favor dos mortos lhes leva alguma consolação? Não hesitemos em socorrer os que partiram e em oferecer as nossas orações por eles” (Hom. 1Cor 41,15). “Os Apóstolos instituíram a oração pelos mortos e esta lhes presta grande auxílio e real utilidade” (In Philipp. III 4, PG 62, 204).

São Cirilo, bispo de Jerusalém († 386)

“Enfim, também rezamos pelos santos padres e bispos e defuntos e por todos em geral que entre nós viveram; crendo que este será o maior auxílio para aquelas almas, por quem se reza, enquanto jaz diante de nós a santa e tremenda vítima”(Catequeses. Mistagógicas. 5, 9, 10, Ed. Vozes, 1977, pg. 38). “Da mesma forma, rezando nós a Deus pelos defuntos, ainda que pecadores, não lhe tecemos uma coroa, mas apresentamos Cristo morto pelos nossos pecados, procurando merecer e alcançar propiação junto a Deus clemente, tanto por eles como por nós mesmos.”(idem) “Em seguida [na oração eucarística], mencionamos os que já dormiram: primeiro os patriarcas, profetas, apóstolos, mártires, para que Deus em virtude de suas preces e intercessões, receba nossa oração. Depois, rezamos pelos nossos santos pais e bispos falecidos, e em geral por todos os que já dormiram antes de nós. Acreditamos que esta oração aproveitará sumamente às almas pelas quais é feita, enquanto repousa sobre o altar a santa e temível vítima. Quero, neste ponto, convencer-vos por um exemplo. Sei que muitos dizem: “Que aproveita à alma que passou deste mundo, em pecado ou sem ele, se a recordo na oferenda?” Se um rei, porventura, banir cidadãos subversivos, mas depois os súditos fiéis tecem uma coroa e a oferecem ao rei pelos que estão cumprindo pena, não é certo que lhes concederá o perdão do castigo? Da mesma forma, nós, oferecendo a Deus preces pelos mortos, sejam ou não pecadores, oferecemos, não coroa tecida por nossas mãos, mas Cristo crucificado por nossos pecados; assim, tornamos propício o Deus amigo dos homens aos pecados nossos e deles”. (Catequeses Mistagógicas)

Santo Epifânio († 403), bispo da ilha de Chipre

“Sobre o rito de ler os nomes dos defuntos (no sacrifício) perguntamos: que há de mais nisso? Que há de mais conveniente, de mais proveitoso e mais admirável que todos os presentes creiam viverem ainda os defuntos, não deixarem de existir, e sim existirem ao lado do Senhor? Com isso se professa uma doutrina piedosa: os que oram por seus irmãos defuntos abrigam a esperança (de que vivem), como se apenas casualmente estivessem longe. E sua oração ajuda aos defuntos, mesmo se por elas não fiquem apagadas todas as dívidas... A Igreja deve guardar este costume, recebido como tradição dos Pais. Pois quem haveria de suprimir o mandato da mãe ou a lei do pai? Conforme o que diz Salomão: “tu, filho meu, escuta as correções de teu pai, e não rejeites as advertências de tua mãe”. Com isto se ensina que o Pai, o Deus unigênito e o Espírito Santo, tanto por escrito como sem escritura, nos deram doutrinas, e que nossa Mãe, a Igreja, nos legou preceitos, os quais são indissolúveis e definitivos”. (Haer. 75, c. 8: PG 42, 514s) Nas Atas de Santa Perpétua de Cartago, do início do século III, mártir, na África, ela aparece orando por seu irmão Dinócrate, o qual morrera jovem: pedia que ele fosse transferido do lugar de padecimento em que se achava, para um “lugar de refrigério, de saciedade e de alegria”. Finalmente, viu Dinócrate, de coração puro, revestido de bela túnica, a gozar de refrigério, saciedade e alegria, como uma criancinha que sai da água e se dispõe a brincar. (Passio, S. Perpétua VIIs; PR, idem) Os “Cânones de Santo Hipólito (160-235)”, que se referem à Liturgia do século III, contém uma rubrica sobre os mortos... “... caso se faça memória em favor daqueles que faleceram...” (Canones Hippoliti, em Monumenta Ecclesiae Liturgica; PR, 264,1982) Serapião de Thmuis (século IV), bispo, no Egito, compôs uma coletânea litúrgica, onde se pode ver a intercessão pelos irmãos falecidos: “Por todos os defuntos dos quais fazemos comemoração, assim oramos: ‘Santifica essas almas, pois Tu as conheces todas; santifica todas aquelas que dormem no Senhor; coloca-as em meio às santas Potestades (anjos); dá-lhes lugar e permanência em teu reino.” (Journal of Theological Studies t. 1, p. 106; PR , 264,1982) “Nós te suplicamos pelo repouso da alma de teu servo (ou de tua serva) N. ; dá paz a seu espírito em lugar verdejante e aprazível, e ressuscita o seu corpo no dia que determinaste”. (PR, 264,1982) As Constituições Apostólicas, do fim do século IV, redigidas com base em documentos bem mais antigos, no livro VIII da coleção, diz: “Oremos pelo repouso de N. , afim de que o Deus bom, recebendo a sua alma, lhe perdoe todas as faltas voluntárias e , por sua misericórdia, lhe dê o consórcio das almas santas.” Em todas as missas, em qualquer das formas da Oração Eucarística, a Igreja ora pelas almas: “Lembrai-vos também dos que morreram na paz do vosso Cristo e de todos os mortos dos quais só vós conheceis a fé”. ( Oração Euc. IV) “Lembrai-vos também dos nossos irmãos e irmãs que morreram na esperança da ressurreição e de todos os que partiram desta vida: acolhei-os junto a vós na luz da vossa face.”(Or. Euc. II) “Lembrai-vos dos nossos irmãos e irmãs ... que adormeceram na paz do vosso Cristo, e de todos os falecidos, cuja fé só vós conhecestes: acolhei-os na luz da vossa face e concedei-lhes, no dia da ressurreição, a plenitude da vida.” (Or. Euc. VI-A) “Ó Pai, sabemos que sempre vos lembrais de todos. Por isso, pedimos por aqueles que nós amamos... e por todos os que morreram em vossa paz.”(Or. Euc. IX - crianças 1) “A todos os que chamastes para a outra vida na vossa amizade, e aos marcados com o sinal da fé, abrindo os vossos braços, acolhei-os. Que vivam para sempre bem felizes no reino que para todos preparastes.” (Or. Euc. V)

Catecismo da Igreja Católica

“Reconhecendo cabalmente esta comunhão de todo o corpo místico de Jesus Cristo, a Igreja terrestre, desde os tempos primevos da religião cristã, venerou com grande piedade a memória dos defuntos...”(CIC, § 958) “A nossa oração por eles [no purgatório] pode não somente ajudá-los, mas também torna eficaz a sua intercessão por nós”. (CIC, § 958)

Ensinamentos do Papa João Paulo II

“... Igreja do Céu, Igreja da Terra e Igreja do Purgatório estão misteriosamente unidas nesta cooperação com Cristo para reconciliar o mundo com Deus.”(Reconciliatio et poenitentia, 12) “... é inegável a dimensão social deste sacramento [a confissão], no qual é toda a Igreja - militante (na terra), a padecente (no Purgatório), e a triunfante ( no Céu) - que intervém em auxílio do penitente e o acollhe de novo em seu seio, tanto mais que toda a Igreja fora ofendida e ferida pelo seu pecado”. (RP, 31, IV) “Numa misteriosa troca de dons, eles [no purgatório] intercedem por nós e nós oferecemos por eles a nossa oração de sufrágio. “ (LR de 08/11/92, p. 11) “... os vínculos de amor que unem pais e filhos, esposas e esposos, irmãos e irmãs, assim como os ligames de verdadeira amizade entre as pessoas, não se perdem nem terminam com o indiscutível evento da morte. Os nossos defuntos continuam a viver entre nós, não só porque os seus restos mortais repousam no cemitério e a sua recordação faz parte da nossa existência, mas sobretudo porque as suas almas intercedem por nós junto de Deus”. (02/11/94)

“A tradição da Igreja exortou sempre a rezar pelos mortos. O fundamento da oração de sufrágio encontra-se na comunhão do Corpo Místico... Por conseguinte, recomenda a visita aos cemitérios, o adorno dos sepulcros e o sufrágio, como testemunho de esperança confiante, apesar dos sofrimentos pela separação dos entes queridos”(LR, n. 45, de 10/11/91)

sábado, setembro 10, 2016

Amar provoca mudanças



A pergunta que podemos fazer nesse 24º Domingo do Tempo Comum é: Até quanto podemos amar? Certa vez Pedro Pergunta a Jesus quantas vezes devemos perdoar o irmão e Jesus responde que não só sete, mas, setenta vezes sete, ou seja, sempre, infinitamente. Nesse mesmo intuito responderia a pergunta inicial, devemos amar sempre.

Na primeira leitura do Êxodo Moisés se encontra na montanha, lugar do encontro com Deus, com o próximo e consigo mesmo. No encontro com Deus Moisés recebe os mandamentos e, ainda a ira pelo “teu povo” (Ex 3, 7) fazer uma imagem Dele e adorá-lo. No encontro com o próximo, Moisés, assim como foi Abrão, se configura como mediador que recorda a Deus não os pecados do seu povo, mas a justiça e a misericórdia que é a verdadeira imagem de Deus. No encontro consigo mesmo descobre que Deus fará dele “uma grande nação”. A descendência de Moisés não pode se valer do pecado como base de um relacionamento. A capacidade de amar, até mesmo os limites do outro é o legado que Deus e a descendência de Moisés deixa a nós hoje.

O apóstolo Paulo como vemos na segunda leitura, é um exemplo desse legado que vê o homem a partir de suas possibilidades, sobretudo, de amar. Teria Deus todos os motivos para julgar Paulo de seus crimes, principalmente aqueles cometidos contra os primeiros cristãos. Porém, quis Deus continuar amando e, talvez, tenha sido a razão da conversão de Paulo. Ao contrário de nós humanos, que mudamos a partir do erro do outro, esperando uma melhora, Deus continua amando mesmo que a resposta seja o contrário. A insistência de amar é o que provoca a mudança.

O Evangelho de Lucas 15 vai na mesma lógica das leituras anteriores, o que vale é o amor e não o pecado. Todo esse capitulo é preenchido com as chamadas “parábolas da misericórdia”. Das três narradas hoje, a primeira (ovelha perdida) encontra-se em Mateus e Lucas, as outras duas (moeda perdida e o filho pródigo) exclusivas de Lucas. Jesus conta essas parábolas em meio aos reconhecidos como indignos (cobradores de impostos e pecadores) e, por isso, questionado por fariseus e publicanos reconhecidos como dignos. Na lógica do amor não existe o indigno e o digno, existe o homem e a mulher que ao se encontrarem perdidos, são procurados, valorizados e, consequentemente, feito a festa.

Portanto, não sei qual a imagem que fazemos de Deus? Se esta imagem é de um Deus que visa o pecado e que se preocupa apenas com os bons ou aqueles que rendem, esse não é Deus se levarmos em conta o legado dos nossos patriarcas (Abraão, Isac, Jacó, Moisés). Contudo, se a imagem que temos de Deus é de um Deus que não sabe rejeitar um homem sequer, pois rejeitar um é rejeitar todos, na lógica do amor, então estamos dando continuidade a um legado que tem sua base no amor. Se quisermos uma prova que estamos ou não no caminho certo, basta se perguntar se nossa preferência é ou não os mais 
necessitados.

Frei Pedro Júnior, OFM

sexta-feira, setembro 09, 2016

REVELAÇÕES DE SANTA BRÍGIDA. Sobre o matrimônio



Jesus diz: '' - Na antiga Lei havia sido permitido a um homem ter várias mulheres, de forma que o povo não fosse deixado sem descendência ou tivessem que se casar com os gentios. Mas na minha Nova Lei, é permitido a um homem ter uma mulher, e é proibido a ele, durante seu tempo de vida ter várias mulheres. Aqueles que se unem com amor e temor divinos, para o bem da procriação e para criar filhos para a honra de Deus, são meu templo espiritual onde eu desejo morar como o terceiro com eles. 

Mas as pessoas nestes tempos se unem em matrimônio por sete razões. Primeiro, pela beleza facial; segundo, pela riqueza; terceiro, pelo prazer grosseiro e gozo indecente que conseguem no desejo sexual impuro; quarto, pelas festas com amigos e glutonaria descontrolada; quinto, por causa da vaidade no vestir,e comer, na brincadeira, entretenimento e jogos e em outras futilidades; sexto, pelo bem procriar filhos mas não criá-los para a honra de Deus ou boas obras, mas para bens materiais e honra; sétimo, se unem pela luxúria e eles são como bestas grosseiras em seus desejos luxuriosos. 

Eles vêm às portas da minha Igreja em comum acordo e, consentimento, mas seus desejos e pensamentos são completamente contra mim. Eles preferem sua própria vontade, que visa agradar o mundo, ao invés da minha vontade. Se todos os seus pensamentos e vontades fossem dirigidos a mim, e eles colocassem sua vontade em minhas mãos e se casassem em meu temor, então eu lhes daria o meu consentimento e seria como o terceiro com eles. Mas, agora meu consentimento, que seria a coisa mais preciosa para eles, não lhes foi dado, porque têm mais luxúria em seu coração do que amor por mim. Desde então, eles sobem ao meu altar onde ouvem que devem ser um só coração e alma, mas meu coração se aparta deles porque não possuem o calor de meu coração e não conhecem o sabor de meu corpo. 

Eles buscam o calor e prazer sexual que perecem e amam a carne que será comida pelos vermes. Assim, estas pessoas se unem em matrimônio sem o laço e união de Deus Pai, sem o amor do Filho e sem o consolo do Espírito Santo. Quando o casal vai para a cama, meu Espírito o abandona imediatamente e o espírito de impureza se aproxima em seu lugar porque eles se unem somente pelo prazer e não conversam entre si. Mas, minha misericórdia ainda estará com eles desde que se convertam a mim. 

Devido ao meu grande amor, Eu coloco uma alma vivente criada por meu poder na semente deles. Às vezes, permito que os maus pais tenham bons filhos, mas é mais frequente que nasçam maus filhos de maus pais, pois estes filhos imitam as más ações e injustiças de seus pais tanto quanto podem e os imitariam ainda mais se minha paciência permitisse. Um casal assim, nunca verá meu rosto, a menos que se arrependa, porque não há pecado tão pesado ou grave que não possa ser limpo pela penitência e o arrependimento. 

Por essa razão, desejo voltar ao matrimônio espiritual, o tipo que é apropriado para Deus ter com uma alma casta e corpo puro. Existem sete coisas boas nele em oposição aos males mencionados acima. Primeiro, não há desejo pela beleza da forma ou beleza corporal ou olhares voluptuosos mas somente olhares e amor de Deus. Segundo, não há desejo de possuir nada mais do que é necessário para sobreviver, e somente as necessidades com nada em excesso. Terceiro, eles evitam as conversas vãs e frívolas. Quarto, eles não se preocupam com ver amigos ou parentes, porque Eu sou o seu amor e desejo. Quinto, eles desejam manter a humildade interiormente em suas consciências e exteriormente no modo como se vestem. Sexto, eles nunca têm nenhuma vontade de conduzir-se pela luxúria. Sétimo, eles geram filhos e filhas para seu Deus, por meio de seu bom comportamento e bom exemplo e mediante o uso de palavras espirituais. 

Eles preservam sua fé incorrupta quando permanecem fora das portas de minha igreja onde me dão seu consentimento e Eu lhes dou o meu. Eles sobem ao meu altar onde desfrutam do gozo espiritual de meu corpo e sangue, em cujo deleite eles desejam ser um só coração, um só corpo e uma só vontade comigo, e Eu, verdadeiro Deus e homem, todo poderoso no Céu e na terra, serei como o terceiro com eles e preencherei seus corações. Os esposos mundanos começam seu matrimonio em desejos luxuriosos como bestas brutas, e mesmo pior que bestas brutas! Mas esses esposos espirituais começam em amor e temor de Deus e não se preocupam em agradar ninguém a não ser a mim. No casamento mundano o espírito do mal enche e incita ao deleite carnal onde não há nada mais que podridão, mas esses de casamento espiritual são cheios do meu Espírito e inflamados com o fogo do meu amor que nunca lhes faltará.

 Eu sou um Deus em três pessoas, e um em divindade com o Pai e o Santo Espírito. Assim como é impossível para o Pai estar separado do Filho e o Espírito Santo estar separado de ambos, e assim como é impossível o calor estar separado do fogo, também é impossível para esses esposos espirituais estarem separados de mim; Eu sou sempre como o terceiro com eles. Meu corpo foi ferido uma vez e morreu em tormentos, mas ele nunca mais será ferido nem morrerá. Da mesma forma, aqueles que são incorporados em mim com uma verdadeira fé e vontade perfeita, nunca morrerão longe de mim; pois onde quer que fiquem, ou sentem ou caminhem, estarei sempre com eles como seu terceiro."