Paulo Corrêa de Brito Filho
A Ave Maria é a prece mariana por antonomásia. Para se
chegar à formulação da Ave
Maria atual, foi necessário percorrer um caminho
de muitos séculos.
Essa oração
é composta de duas partes. A primeira consta de uma dupla saudação extraída do Evangelho:
1 – A
saudação do Arcanjo Gabriel, enviado por Deus a fim de anunciar a divina
maternidade de Maria: “Ave, cheia de graça, o Senhor é
contigo” (Lc 1, 28);
2 – A
saudação de Santa Isabel, prima de Nossa Senhora, que, inspirada pelo Espírito
Santo, proclamou: “Bendita és
tu entre as mulheres e bendito é o fruto de teu ventre” (Lc 1, 42). A essas duas saudações
foram acrescidas duas palavras para que elas fossem mais distintamente
enunciadas (Maria, Ave-Maria...)
e Jesus (de teu ventre, Jesus)।
A segunda parte da
oração contém uma súplica।
Os teólogos
apresentam diversas razões de conveniência para que a Anunciação a Maria
Santíssima tenha sido feita por um anjo. Dentre elas, duas podem ser aduzidas:
1 – Como a
virgindade é conatural aos anjos, foi conveniente que um deles recebesse a
missão de fazer esse anúncio a Maria, a qual, vivendo em carne, levava uma vida
verdadeiramente angélica (cfr. Santo Tomás de Aquino, Suma teológica, III, q. 30, a, 2, c.);
2 – O anjo
— e não o homem, maculado pelo pecado original — era o legado mais apto e
conveniente para ser enviado à puríssima Virgem, isenta, como os anjos, de toda
a culpa.
Quando
começaram os primeiros cristãos a saudar a Santíssima Virgem com as palavras do anjo ou de Santa Isabel?
Provavelmente, quando tiveram em mãos o Evangelho de São Lucas.
O primeiro
documento escrito em que aparece o uso da saudação do anjo é a Homilia de um
certo Theodoto Ancyrani, falecido antes do ano 446. Nela é explicitamente
afirmado que, impelidos pelas palavras do anjo, dizemos: “Ave, cheia de graça, o Senhor é
contigo”.
Quanto à
saudação de Santa Isabel, aparece ela unida à do anjo por volta do século V. As
duas saudações conjugadas já se encontram nas liturgias orientais de São Tiago
(em uso na Igreja de Jerusalém), de São Marcos (na Igreja Copta) e de São João
Crisóstomo (na Igreja de Constantinopla).
Na Igreja
latina, entretanto, as referidas saudações aparecem pela primeira vez unidas
aproximadamente no século VI, em obras de São Gregório Magno.
O nome
Maria foi acrescentado às palavras do anjo, no Oriente, por volta do século V,
segundo parece, na liturgia de São Basílio; no Ocidente, porém, parece que isto
ocorreu aproximadamente no século VI, figurando numa das obras de São Gregório
Magno, o Sacramentário
Gregoriano.
O nome Jesus foi acrescido às palavras de Santa
Isabel provavelmente um século depois, no Oriente, figurando pela primeira vez
em certo Manual dos Coptas, talvez no século VII; no Ocidente, todavia, o
primeiro documento que registra o nome do Redentor é a Homilia III sobre Maria, mãe virginal, de Santo Amedeo, Bispo de Lausanne
(Suíça) (aproximadamente em 1150), discípulo de São Bernardo. Nos mencionados
documentos, ao nome Jesus encontra-se adicionada a palavra Christus.
A segunda
parte da prece (Santa Maria, etc.), a súplica, já era empregada na Ladainha dos
Santos. Em determinado código do século XIII, da Biblioteca Nacional
Florentina, que já pertencera aos Servos
de Maria do Convento da Beata Maria Virgem
Saudada pelo Anjo, em
Florença, lê-se esta oração: “Ave
dulcíssima e imaculada Virgem Maria, cheia de Graça, o Senhor é contigo,
bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto de teu ventre, Jesus. Santa Maria, Mãe de
Deus, mãe da graça e da misericórdia, rogai por nós agora e na hora da morte.
Amém.
Nesta
fórmula, faltam somente dois vocábulos: [nós] pecadores e nossa[morte].
A fórmula
precisa da Ave Maria, como é rezada hoje, encontra-se pela
primeira vez no século XV, no poema acróstico do Venerável Gasparini Borro,
O.S.M. (+ 1498).
A segunda
parte da Ave Maria foi sempre rezada em caráter privado
pelos fiéis até o ano de 1568, quando o Papa São Pio V promulgou o novo Breviário Romano, no qual figura a fórmula do
referido Venerável Gasparini Borro, sendo estabelecida solenemente sua
recitação no início do Ofício Divino, após a recitação do Pai Nossoe prescrita para todos
os sacerdotes। Depois de um século a mencionada
fórmula, sancionada pelo Sumo Pontífice, difundiu-se, de fato, em toda a Igreja
universal.
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Biografia:
1. Pe. Gabriel M. Roschini O.S.M., Mariologia, tomus II, Summa
Mariologiæ, Pars III, De singulari cultu B.M.V., secunda editio, Ângelus
Belardetti Editor, Romæ, 1948.
2. D. Gregório Alastruey, Tratado de la Virgen Santíssima,
Biblioteca de Autores Cristianos (BAC), 4ª edição, Madrid, 1956.
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